Recanto nem tão secreto de uma Ariana

Aceita um copo? Então sente-se, acomode-se e divirta-se.

29 agosto, 2008

Palavras no Papel

Uma one-shot curtinha do meu casal preferido... postada originalmente no ff.net em 30/06/2006



Palavras no Papel



A vida é tão engraçada, às vezes. Eu cresci quase sozinho, isolado em uma região montanhosa, de difícil acesso. Todos os dias olhava para a imensidão do céu, para as estrelas e sonhava em poder viajar, em poder sair dali, em conhecer mais. Um dia, quando eu menos esperava meus pais faleceram numa avalanche, depois de um dilúvio a tentar proteger-me. A perda deles, em si, foi bastante dolorosa e mais doloroso ainda foi me ver completamente sozinho, naquele enorme castelo, no alto da montanha. Continuei a tocar minha quase inútil vida afinal não tinha outra alternativa, cuidando do rebanho de carneiros, indo a vila trocar lã, leite, carne de carneiro e queijo por outros itens e lendo a maior parte do tempo. Sozinho... Sempre sozinho...

Um dia, me lembro deste lindo dia até hoje, minhas preces foram atendidas. Um grupo de pesquisadores chegou a minha propriedade, pediram para se instalar com o intuito de estudar constelações. Era o local ideal. Não havia cidades perto, não havia luz elétrica num raio de quilômetros quadrados, estávamos a grande altitude e o céu se descortinava límpido, azul, com estrelas brilhantes. O chefe dos pesquisadores, em troca da minha hospedagem, começou a me ensinar. Percebi que, com minhas observações, conhecia mais de astronomia do que jamais pudesse acreditar ser possível.

Foram anos e anos de estudo árduo. Sem tempo nem mesmo para respirar. Eu, que antes, nada tinha para fazer, agora não tinha tempo nem sequer para cuidar do jardim em volta do castelo, cujo mato crescia desordenadamente. Mas eu estava tão feliz. Feliz como nunca fora antes, nem mesmo quando meus pais eram vivos. Algumas vezes me repreendia ao pensar neles e me descobrir mais feliz naquele momento. O tempo foi passando. Acabei me formando por correspondência. Seria estupidez minha sair do lugar perfeito para pesquisas, com o melhor e mais renomado astrônomo da atualidade para ir me enfiar em um bolorento banco de universidade em algum lugar qualquer do mundo. Tirei um diploma "meia-boca" só para fins quase que estatísticos e para cumprir burocracia. Alguns meses depois de chegar o meu diploma, meu mestre também veio a falecer. Fiquei novamente sozinho. Sofri novamente a perda. Mas agora não estava tão sozinho assim. Tinha as estrelas para me acompanhar. Comecei a pesquisar as constelações e me interessei pelo zodíaco. Pela linha tênue que separa a Astronomia da Astrologia em determinado momento.

É um campo de trabalho que não é bem aceito pela comunidade acadêmica. Para os academicistas a Astrologia não passa de crendice e superstição popular e que muitos pseudo-videntes se aproveitam para ganhar dinheiro. Eu poderia realmente dizer que eles tem muita razão. Mas existem estudos realmente sérios. Existe muito de ciência por trás da “arte advinhatória”. E foi atrás desta ciência, da busca pela verdade – hoje tenho consciência que não existe uma verdade absoluta – que comecei as minhas viagens e peregrinações. Eu ganhara muito dinheiro, tendo recebido de herança todo legado de meu mestre além de meus próprios trabalhos acadêmicos e descobertas terem me garantido bons fundos. Quando eu achava que estava precisando de um trocado, fazia algumas conferências, até mesmo para me divertir um pouco. A minha própria figura já era motivo de estranheza. Muitas vezes eu ouvia cochichos pelos corredores tais como: “só podia ser discípulo de quem era mesmo... se fosse filho não seria tão parecido, tão esquisito e tão inteligente quanto Shion.” Eu só podia sorrir, para mim era um enorme elogio ser comparado e equiparadoa Shion.

Depois de um ciclo de conferências na Europa e América, resolvi voltar para a Ásia – que era o meu lugar – e descansar um pouco, voltando´às minhas pesquisas “secretas”. Por mais que convivesse com o Ocidente, eu sempre seria Oriental, sempre seria Tibetano. Sempre seria hinduísta e sempre acreditaria que a ciência é importante sim, mas que se os Deuses quiserem subvertê-la, eles o fariam. Desta vez, antes de voltar para meu Castelo no Tibete, fui peregrinar pela Índia. Foi quando o conheci.

Já conhecera muita gente, desde que passara a dar palestras e participar de conferências. Mas nunca vi ninguém tão lindo. Tão perfeito. Tão... tão... tão... Shaka. Eu nunca me preocupei com o meu coração. Na realidade nem sabia que ele existia. Assim como nunca me preocupei com questões simples como sexualidade. Para mim, sempre foi indiferente se a relação era hetero ou homo, bastava que existisse amor. Mas, como tudo mais em minha vida, estas considerações eram meramente teóricas. Isto, até conhecê-lo. Me apaixonei, me perdi e me achei...

- Mu, por Buda, será quem nem nas férias você é capaz de largar a caneta e o papel.

- Desculpe, não resisti. Acho que deve ter algum tipo de imã entre minha mão e a caneta.

- O que está escrevendo desta vez, mas alguma teoria? Seu mapa astral não fala de nenhuma descoberta mirabolante, pelo menos não nos próximos quinze dias...

Shaka se debruçou sobre o ombro de Mu e arrancou o caderno da mão dele, lendo as linhas rascunhadas a esmo.

- Hummm, o grande intelectual agora resolveu virar romancista? Mas que coisa mais piegas ou mais presunçosa, começar com a própria biografia.

- Às vezes você é insuportavelmente irritante, sabia?

- É claro que eu sei. E adoro isso. Você fica lindo irritado. Adorei a parte do apaixonado, sabia. Até que seu estilo não é dos piores, mas podia melhorar um pouco...

Mu arrancou o caderno das mãos de Shaka e o jogou em um canto qualquer.

- Deixa pra lá, seu virginiano perfeccionista, ninguém vai ler isso mesmo.

- Eu sou ninguém?

- Não era nem mesmo para você ter lido, mas como é enxerido mesmo... Se quiser continuar a ler, vai ter que aturar meu estilo. Mas agora tenho uma idéia melhor...

Mu abraçou Shaka e começou a beijar seu pescoço. O louro imediatamente ficou todo arrepiado.

- Sabe, tem coisas que você faz bem melhor do que escrever.

- Acha então que poderia ganhar dinheiro com meus outros talentos?

- Mu! Não ouse nem pensar em algo assim. Se eu ver estes dedos alvos e belos encostando em alguém além de mim, eu juro que sou capaz de cometer um assassinato sem dó nem piedade.

- Eu escondo suas lentes de contato, assim você não vai ver, se eu encostar em alguém.

- Sem graça, ainda bem que é astrônomo e não humorista, senão eu teria que vender milhares de mapas astrais para que conseguíssemos nos alimentar, se bem que eu poderia também catar os tomates que, com certeza, você seria alvejado.

- Você fica lindo com ciúmes. Que tal um passeio?

- Eu estava pensando em outra coisa.

- Safado. Temos todo tempo do mundo pra isso. Mas o dia está belo, o sol lindo, a areia fofa e faz anos que não tiramos férias. Queria aproveitar.

- Que seja! Vamos aproveitar então. Deixe-me calçar os chinelos.

Mu pegou novamente o bloquinho esperando Shaka. Sabia que o “calçar os chinelos” era um ritual que demoraria no mínimo, com sorte, meia hora mas valia a pena esperar.

"Desde a primeira vez que o vi, sabia que ele seria meu, e foi. Já estávamos juntos há anos, mas não me cansava de olhar para aquela figura diáfana, loira, um escultural corpo perfeito com os músculos nos lugares certos. Agora ele me aparecia naquela sala, com uma bata de algodão cru, aberta no peito, calças pescador de algodão cru também, sandálias de couro rasteiras, algumas pulseiras artesanais de palha, e os longos cabelos soltos e escovados. Ele tirou as lentes de contato, dizia que a maresia e o vento ressecavam as lentes e isso o incomodava, seus belos olhos azuis estavam escondidos atrás de óculos de aro de tartaruga mas, secretamente, eu adoro quando ele está de óculos - seria um completo suicida se falasse isso. "

- Vamos? – Shaka esticou a mão para Mu, a convidá-lo.

- Vamos! - Mu não pensou duas vezes. Certos convites eram raros como pedras preciosas e não deviam ser desperdiçados.

A praia, o sol, a areia, o mar, a água de coco gelada, o vento bagunçando os cabelos. A vida era perfeita para Mu. Ele caminhava ao lado de Shaka pela orla, pensando e admirando um dos mais belos espetáculos da natureza. O mundo, os deuses, foram muito generosos com ele. De repente, ele parou, virou-se para Shaka em um rompante de romantismo piegas.

- Eu te amo, sabia?

Frase do dia
"Usamos os espelhos para ver o rosto
e a arte para ver a alma."
( George Bernard Shaw )

26 agosto, 2008

Enquanto isso... Na Sala do Recanto IX

Milo: hahahahahahahahaha Eu sabia que o Shun era chegado a esportes "suspeitos"...

Saga: Não sei bem do que você está falando... Ele pegou um mulherão e você? Quem é suspeito aqui?

Milo: Oras... sou gay, é verdade.... mas não fico por ai andando de colanzinho fazendo piruetas!

Shun: Ei!!!! Não falem de mim nas minhas costas!!! - chegando esbaforido depois do último treinamento.

Milo: Eu falo é pela frente mesmo... Se eu falar pelas costas o Camus briga comigo..... hehehehehehe

Shun estreitou os olhos e ia partindo para as "vias de fato" quando AA resolveu intervir.

AA: Será que vocês não conseguem uma conversa sadia sem brigar?

Todos: Não!!!!

AA: Então querem brigar... *tira o baralho do bolso* Podem começar a jogar!

Todos: Baralhooooooooooo!!!!!!!!! Obaaaaaaaaaaa!!!!!!!!!!!!!!

AA: Crianças...

Frase do Dia

"Quem não dispõe de reservas em si
próprio, é assaltado pelo aborrecimento que o espreita e em breve o dominará."
( Émile-Auguste Chartier )

25 agosto, 2008

Noite de Gala

Esta foi uma fic única em minha carreira. Naveguei por mares nunca dantes navegados e não retornei a eles... quem sabe um dia... fic postada originalmente no ff.net em 18/04/2006 em resposta a um desafio de June Briefs, segue versão revista.


Uma noite de gala


Era noite de gala. Toda a sociedade do Canadá se encontrava presente. O pior já havia passado. As competições já acabaram. Todos os grandes patinadores de todo o mundo estavam presentes. A técnica, a beleza, as luzes, a roupa tudo era um luxo.

Shun e June representavam o Japão. Estavam juntos desde sempre. Cresceram juntos e hoje se apresentavam juntos. Durante as competições foram medalha de bronze ganhando o direito de participar da noite de gala, mas não era o suficiente. Treinaram e se dedicaram para o ouro. Era o que eles queriam, era o que o treinador Albion almejava, era o que todos esperavam deles.

Os outros patinadores da equipe olhavam para eles com escárnio. Sempre disseram que eles não estavam preparados para o resto do mundo e o reles bronze provava isso. Ninguém era capaz de se lembrar que eles competiram com mais de trinta dos melhores casais de patinação artística do mundo e que ninguém, além deles, conseguira uma colocação digna de ser mencionada.

- June, o que houve com você? Estava dura como uma tábua, pesando uma tonelada! – Shun tinha plena consciência de ter dado o melhor de si. Creditava a derrota a sua companheira.

- Eu! Agora a culpa é minha? Se olhe! Pegue o vídeo e veja a sua cara de mulher grávida! – June obviamente não aceitava asacusações. Em uma dupla se algo não corria bem, ambos eram culpados, não um ou outro.

A discussão entre eles se tornara tão violenta que eles nem mais se olharam durante o resto da semana.

O grande dia chegara. Era a apresentação de gala. Eles tinham a obrigação de se apresentar, mesmo que fosse pela última vez. Durante todo o tempo de preparo para o mundial se preocuparam com esta noite especial. Ela deveria ser a glorificação de seus esforços, a coroação de seu melhor momento juntos e agora tinha o gosto amargo de prêmio de consolação.

A escolha da música rendera muitas discussões e risadas e por fim um acordo. Dio come ti amo. A escolha foi feita em um momento de felicidade. Estavam juntos, estavam se amando, e agora? Não se olhavam, não se falavam, como patinar juntos?

Shun passara o dia concentrado. Revia em sua cabeça toda a coreografia ensaiada exaustivamente. Cantarolava a música marcando sozinho cada passo, cada salto, cada spin. Enquanto cantarolava sua vida com June passava como um filme por sua cabeça, como se a coreografia fosse um teatro deles. Da vida deles.

Tentou rememorar o momento que a conhecera, mas foi simplesmente impossível, suas vidas se entrelaçavam de tal forma que não saberia viver só. Sozinho ele estava incompleto. Esta constatação chegou suavemente, mas fora um choque. De repente percebera que sem ela era meio, era nada e que a estava perdendo rapidamente. Tinha uma única chance. Tinha uma única noite para reconquistar seu amor, para voltar a estar inteiro. Daria o melhor de si para reconquistá-la, para reconquistar a si mesmo.

Finalmente o momento especial, a grande hora chegara. Shun olhou para June e não pode deixar de pensar em como ela estava linda, vestida completamente de negro com apenas alguns detalhes dourados. A roupa contrastava com os longos cachos dourados dando um efeito simplesmente maravilhoso. June não pode deixar de admirar Shun também. A roupa dele era dourada com detalhes negros, fazendo um par perfeito com ela. "Como ela poderia se separar dele?" – pensava – afinal June não existia sem Shun, na profissão, na vida, no amor.

Entraram juntos na arena, de mãos dadas, mas sem se olharem. Todos podiam perceber que algo acontecia com o casal perfeito da patinação. Era como se o gelo entre eles fosse maior do que o do ringue sobre o qual deslizavam.
Os primeiros acordes puderam ser ouvidos por todo o estádio. A apresentação se iniciara perfeita. Estavam juntos, sincronizados, mas não se olhavam nos olhos. Executavam os passos quase que mecanicamente.

Nel cielo passano le nuvole
No céu passam as nuvens
Che vanno verso il mare
Que vão até o mar
Sembrano fazzol etti bianchi
Parecem lencinhos brancos
Che salutano il nostro amore
Que saúdam o nosso amor

Shun cantarolava a música enquanto levava June em seus braços e percebera, naquele momento, o quanto aquela música descrevia os dois e o quanto ele a amava. O primeiro refrão estava chegando. De acordo com a coreografia ele teria de se ajoelhar perante June e fazer um gesto declarando seu amor por ela. A hora era essa. Era o momento “agora ou nunca”. Shun se ajoelhou como nos ensaios, mas não fez o gesto ensaiado. Segurou a mão de June e cantou em alto e bom som:

Dio come ti amo
Deus como te amo
- June, você me perdoa?

Levantou-se e continuou a coreografia. A partir deste momento olhava intensamente para ela, como se naquele lugar somente ela estivesse presente. Como se nada mais importasse. A verdade era que nada mais importava mesmo. Somente ela.

Non é possibile
Não é possível
Avere tra le braccia
Ter em teus braços
Tanta felicitá
Tanta felicidade
Baciare le tue labbra
Beijar os teus lábios
Che odorano di vento
Que perfumam o vento
Noi due inammorati
Nós dois enamorados
Como nessuno al mondo
Como ninguém no mundo

June ficara desconcertada com a declaração e o pedido de desculpas público de Shun. Nunca imaginara que seu tímido companheiro fosse capaz de algo tão ousado. Seu coração se enchera de amor e de uma felicidade tão suprema que continuara a patinar, não com o corpo, mas com a alma. A letra da música tocando-a fundo. O olhar penetrante e apaixonado dele, rasgando seu coração e se alojando fundo. Dominado-a toda.

Dio come ti amo
Deus como te amo

Mi vien da piangere
Me vem o choro
In tutta la mia vita
Em toda minha vida
Non ho provato mai
Não encontrei jamais
Un bene cosi caro
Um bem assim querido
Un bene cosi vero
Um bem assim verdadeiro
Che puó fermare il fiume
Que pode deter o rio
Che corre verso il mare
Que corre até o mar
Le rondini nel cielo
As andorinhas no céu
Che vanno verso il sole
Que vão até o sol.
Che puó cambiar l’amore
Que pode transformar o amor
L’amore mio per te
O meu amor por ti

O final da música estava chegando. Shun esperava por uma resposta. Shun merecia uma resposta. Era a vez de June ser ousada. Sentiu, mais que ouviu, os acordes do último refrão. Era vez de June cantar.

Dio come ti amo
Deus como te amo

- Shun, você me perdoa?

Eles deveriam acabar a coreografia com o rosto próximo, quase um beijo, mas na hora, no momento, o “quase um beijo” se transformou em um belíssimo beijo. Depois os dois se ajoelharam no ringue, de mãos dadas, juntos cantaram:

Dio come ti amo
Deus como te amo

No dia seguinte, já de volta ao hotel, tomavam café da manhã juntos, calmamente, se preparando para a longa viagem de volta ao Japão quando Albiore entrou esbaforido no restaurante do hotel e jogou um jornal sobre a mesa.

CASAL 20 DA PATINAÇÃO SE RECONCILIA DURANTE APRESENTAÇÃO

Em noite de gala, Shun e June, medalha de bronze em Coreografia Original no Campeonato Mundial de Patinação Artística, dão um show de técnica, profissionalismo e amor ao apresentarem sua coreografia comemorativa ao som de “Dio come ti amo”.
Especulava-se nos bastidores que após a inesperada medalha de bronze o jovem casal japonês iria se separar. Alguns nomes já eram cogitados para acompanhar a bela patinadora, porém, calaram a boca de todos ao provar que estão mais juntos do que nunca ...
Frase do dia

"Um bom general deve não apenas
conhecer o modo de vencer, mas também saber quando a vitória é impossível."
(Políbio)

Enquanto isso... Na Sala do Recanto VIII

A última história foi triste, mas teve um final feliz. Os cavaleiros ali presentes tentavam esconder as lágrimas mas o esforço era completamente em vão.

AA: Eu pensei que homens não chorassem ao ouvir histórias...

Dite: Tem algum homem aqui? Estou vendo apenas um bando de cavaleiros e uma escritora.

AA: E esses cavaleiros por acaso não são homens?

Um silêncio contrangedor tomou conta da sala... AA percebeu que tinha falado besteira, mas essa sempre foi sua especialidade, falar besteiras em horas impróprias.

AA: Meninos... tive uma grande idéia... depois desse monte de lágrimas, que tal dançarmos um pouco. *ligou o DVD com uma seleção de tecno.*

Todos os lenços de papel usados para secar lágrimas viraram munição para atacar a autora sem noção que saiu correndo e ainda não foi encontrada pelos cavaleiros...

Frase do Dia

"Apenas adie até amanhã aquilo
que você quiser morrer e deixar sem fazer."
(Pablo Picasso)

24 agosto, 2008

Olhos violetas, olhos azuis.

Fic postada originalmente no ff.net em 07/04/2006. Música incidental "Roda Viva" de Chico Buarque.


Olhos Violetas, Olhos Azuis



27 de Março


Não sabia exatamente o que estava acontecendo comigo. Era meu aniversário e se eu pudesse ficaria escondido debaixo da cama, com todas as portas lacradas, sem uma fresta de luz a me informar que existe dia do lado de fora.

Minha vida andava uma merda, uma merda se eu fosse, no mínimo benevolente. Porque diabos não me deixaram morto, preso àquela rocha ridícula? Certamente eu estaria sofrendo menos. Ao sofrimento eterno de um santo eu já estava acostumado, mas o que vivia agora...

Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu
Eu sabia o que era a morte, o que era o sacrifício, mas não sabia viver, não sabia envelhecer, não sabia como ser engolido por este mundo. Não sabia sobreviver a ver tudo em que acredito mudar ou ruir. Não seria melhor ter morrido de verdade?

A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega o destino pra lá

Eu queria realmente poder gritar, me rebelar, quebrar tudo, mudar e manter o status quo ao mesmo tempo. Queria ser dono de minha própria vida sem ter que me adaptar. Pode parecer egoísmo, mas quando sacrificamos tudo pelo mundo, deveríamos ter o direito de pedir um pequeno sacrifício por nós.
Eu fiz tudo. Eu dei tudo. E agora? O que me restou? Um Santuário em ruínas, notícias cada vez piores chegando de todos os lados, a ignorância, o esquecimento. Nem mesmo nossos deuses são lembrados ou honrados nesses tempos modernos. Se os tolos soubessem... Se eles tivessem a mínima idéia do que acontece nos bastidores...

Roda mundo, roda-gigante
Roda-moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração

Eu nem sei porque ainda questionava tudo isso. São fatos. Fatos que ocorrem há milênios. Muito antes da minha existência. O mundo gira em torno de si mesmo, o tempo passa e joga a areia do esquecimento sobre o que realmente é importante. Mas o ser humano é tão vaidoso que é incapaz de ver que não somos nada, não valemos nada.

E o mundo continua a girar e eu aqui igual um tolo mais uma vez me questionando sobre a imutabilidade das coisas. Filosofando e me martirizando. De que vale? De que adianta? Pra que serve a minha vida?
A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir
Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a roseira pra lá

Cansei, cansei de lutar, cansei de entregar minha vida para tolos ignorantes que nem mesmo acreditam na minha existência, cansei de tentar agradar a uma Deusa, ingênua, vaidosa e mimada, cansei de entregar meu coração a um homem arrogante, meticuloso e irritantemente burro no tocante a sentimentos. Joguei a toalha.
Roda mundo, roda-gigante
Roda-moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
A roda da saia, a mulata
Não quer mais rodar, não senhor
Não posso fazer serenata
A roda de samba acabou
A gente toma a iniciativa
Viola na rua, a cantar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a viola pra lá

Entreguei os pontos de vez. Eu desisti. Eu não queria mais tentar. Eu não queria mais me iludir. Eu não queria mais viver. Quantas vezes eu implorei? Quantas vezes eu gritei? Quantas vezes tentei nadar contra a corrente do destino? Inúmeras. Incontáveis. Hilariantemente inúteis. O destino sempre me mostrava que ele era mais forte que eu. Eu iria embora. Eu iria embora da vida, embora do mundo. Estava me despedindo no dia em que nasci. Quem sabe assim eu fechasse o ciclo estupidamente inútil da minha existência. Quem sabe assim pelo menos Ele se lembrasse de mim. Quem sabe eu consiguisse o descanso e a paz que tento almejava.

Roda mundo, roda-gigante
Roda-moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração
O samba, a viola, a roseira
Um dia a fogueira queimou
Foi tudo ilusão passageira
Que a brisa primeira levou
No peito a saudade cativa
Faz força pro tempo parar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a saudade pra lá
Roda mundo, roda-gigante
Roda-moinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração

Eu estava prestes a fazer a maior besteira que um ser humano pode fazer, dar fim a minha própria vida. Chegara ao limite do suportável e não conseguia lidar com tantas nuances, tantas reviravoltas, tantos “ses" e “senãos”, mas a vida ao mesmo tempo tão dura, tão cruel, também é capaz de nos surpreender de forma vela, de forma grandiosa.

Eu caminhava desesperadamente à beira do grande precipício que circundava minha morada particular e estava pronto a se atirar em um vôo letal. Não era o super-homem, sabia sim, era verdade, viajar a velocidade da luz, me teleportar, mas não sabia voar e era assim que queria acabar com minha própria vida, mergulhando no vazio, como se mergulhasse dentro de mim mesmo. Mas tudo que eu vivera até agora fora uma ilusão. Inclusive minha própria depressão fora uma funesta ilusão. Perniciosa, Fatídica.

Mais um passo. Era apenas um pequeno passo para o nada, para o descanso, para o esquecimento. Estava prestes a dá-lo quando senti algo suave tocando meu ombro.

- O que pretende fazer?

- Não parece óbvio? – não tinha mais que dar explicações, não tinha porquê ser educado.

- Você sabe que não foi isso que perguntei. Eu sei o que pretende fazer, mas não me parece digno de você.

- E o que é digno de mim? Esta vida de merda? Este sofrimento infindo?

- Eu pensei que era digno de você, mas vejo que estava redondamente enganado...

Pela primeira vez eu me virei e encarei os olhos azuis límpidos daquele que me impedira, que me segurara. Vi lágrimas, vi desespero, ou será que estava apenas vendo um reflexo do que mostrava meus próprios olhos?

- Se realmente está decidido a fazer o que estava prestes a executar, me permita ao menos acompanhá-lo.

- Você iria comigo?

- A qualquer lugar, de qualquer maneira, nem que fosse renegando a dádiva da vida recebida novamente.

- Eu te amo.

- Eu sei. E também te amo. Me perdoe por demorar tanto a perceber isso. Me perdoe por te fazer sofrer. Me perdoe.

Um abraço. Olhos violetas e olhos azuis se encontrando de verdade pela primeira vez. Unidos para sempre.
Frase do Dia

"Você nunca sabe que resultados
virão da sua ação. Mas se você não fizer nada, não existirão resultados."
( Mahatma Gandhi )

19 agosto, 2008

Enquanto isso... Na Sala do Recanto VII

Preconceito... discutimos tanto sobre o assunto e mesmo assim ele está dentro de nós. Em nossas atitudes, em nossas palavras, em nossos pensamentos e sentimentos.

Creio que só existe um remédio para o preconceito, uma boa dose de tolerância, experiência e mea culpa. Todos nós temos o nosso telhado de vidro. Já diria Cristo, "aquele que não tiver um pecado que atire a primeira pedra". Não importa a religião e no que acreditemos, mas esta frase é sábia, assim como são sábios os ensinamentos de Cristo, todavia me pergunto se os seus seguidores fiéis conseguem compreender a amplitude do que está compilado no livro sagrado dos Cristãos.

Mu: Qual é a função de todo este discurso?

AA: Não tem uma função específica além do desabafo. Nada mais, nada menos.

Mu: Acho que o problema não é necessariamente o preconceito, mas a covardia.

AA: Muito obrigada por sua intervenção. Posso continuar?

Mu: Não. Não pode. As pessoas tem de aprender sozinhas a aceitar. Cabe a nós não criticá-las e sim criticar-nos e agir. Só assim o preconceito paulatinamente será uma palavra que cairá em desuso.

AA: Você tem razão, ariano querido. Nada mais tenho a dizer.


Frase do Dia

"Dar ouvidos à preconceitos é
renunciar à liberdade."
(Frei Anselmo)

Preso em Minhas Próprias Teias

Fic publicada originalmente para o aniversário do Peixinho em 09/06/2006 no ff.net. Vamos aos devidos créditos. Música Incidental "Era um Lobisomem Juvenil" do Legião Urbana e o nome Carlo di Angelis para designar o Máscara da Morte é criação da Pipe.

Preso em minhas próprias teias


O aniversário de Afrodite estava chegando. Máscara da Morte andava em seu templo de um lado para o outro como um leão enjaulado. Não sabia bem o que fazer, não sabia o que pensar, enfim não sabia nada...

- Que merda! Eu me odeio! Não, eu odeio o Afrodite!

Deu um soco na parede. Uma enorme rachadura se somou as outras e um filete de sangue escorreu em sua mão. Pouco importava. Nada importava, nada, a não ser ele.

Luz e Sentido e Palavra
Palavra é que o coração não pensa
Ontem faltou água
Anteontem faltou luz
Teve torcida gritando
Quando a luz voltou
Não falo como você fala
Mas vejo bem o que você me diz

Eu nunca seria belo como ele, nunca seria culto como ele, nunca seria refinado como ele, nunca seria veado como ele, mas nunca deixaria de gostar dele. Isso me fazia mal. Eu pensava em mim, pensava nos outros, pensava em minha família, via como outros que tiveram mais coragem que eu sofriam.

Ele sempre me dizia que eu era um covarde, e eu... Tolo, truculento, queria bater, queria xingar, queria machucar, mas só conseguia virar as costas e sair, numa concordância muda. Eu realmente sou o machão mais gay e covarde de todo o universo.

Se o mundo é mesmo parecido com o que vejo
Prefiro acreditar no mundo do meu jeito
E você estava esperando voar
Mas como chegar até as nuvens com os pés no chão

Meu aniversário estava chegando e eu não ganharia o maior de todos os presentes, eu não o ganharia. Já tentei de tudo, já tentei seduzir, já tentei humilhar, já tentei conversar. Você sabia que estava certo. Eu sempre soube que você me queria, mas se encasulou, se enraizou nas teias de seu próprio preconceito de tal forma que agora não conseguia se soltar de maneira nenhuma, não conseguia ou não queria. Covarde!

Afrodite despedaçou mais uma rosa vermelha que havia criado com seu cosmo. A cada momento sua indignação aumentava e suas rosas iam ficando mais e mais vermelhas.

Sinto muitas vezes faz sentido
E Outras vezes não descubro o motivo
Que me explique o porque é
Que não consigo ver sentido
No que sinto, que procuro
Que desejo, que faz parte do meu mundo


Eu sabia o que eu queria, eu sabia o que sentia, eu sabia o que procurava, mas não estava certo. Não era certo, não havia motivo ou justificativa que tornasse meus desejos corretos. De onde eu tirara tanto preconceito? De mim mesmo! E eu aprendia da pior maneira possível como era duro e perigoso este pequeno e mortal sentimento chamado preconceito.

Meu cosmo estava inflado de indignação, de medo e angústia. Ninguém teve coragem de chegar perto, a não ser ele. A bichinha do Santuário era mais macho que qualquer um deles e teve coragem de ir até mim. Com uma rosa na mão, batom nos lábios, chinelos floridos, colocou a porta de meu templo abaixo e entrou!

-Carlo di Angelis, agora você vai me ouvir!

O arco-iris têm sete cores
E fui juiz supremo
Vai vem embora
Volta
Todos têm, todos têm
Suas próprias razões

Eu senti, eu vi o cosmo dele quase destruindo tudo a sua volta e a ele mesmo. Eu não poderia deixar isso acontecer. Eu o amava, apesar de tudo, ou seria apesar de nada.

Eu entrei. Coloquei a porta abaixo. Gritei. Agora ele teria que me ouvir. Eu sabia que ele tinha razões muito fortes para agir como agia. Mas era a minha última tentativa de mostrar a verdade e salvar a beleza daquele amor diferente. Eu também tinha as minhas razões.

- Será que você não percebe? Talvez passemos coisas ruins, mas estaremos juntos. Junto com quem se ama tudo fica fácil. Tudo fica simples. Perdoe a você mesmo e se permita ser feliz.

- Como poderei ser feliz, se não saberia te fazer feliz?

- Não?

Qual foi a semente que você plantou
Tudo acontece ao mesmo tempo
Nem eu menos sei direito
O que está acontecendo
E daí de hoje em diante
Todo dia vai ser o dia mais importante


Ele não falou muito, nem falou claramente, mas foi como uma luz começasse, de forma bem tênue, a iluminar as trevas que eu me encontrava. E, quando finalmente pude perber onde me encontrava, vi que estava a beira do abismo e, na beira do abismo, a única maneira de se andar para frente, é dando um passo atrás. Assim, simples assim, mas tão difícil ao mesmo tempo. Era como parar de beber, ou parar de fumar. Idéias simples, de execução pesarosa. Não falei nada. Não compreendia. Mas sabia e queria e isto bastava. Dei um passo a frente, em direção a ele. Não posso dizer se caí no abismo ou me afastei dele, mas vou viver um dia após o outro. Naquele momento, eu só queria aquele corpo em meus braços. Só isso. Nada mais, nada menos.

Se você quiser alguém pra ser só seu
É só não se esquecer estarei aqui
Se você quiser alguém pra ser só seu
É só não se esquecer estarei aqui


Ele deu o primeiro passo, o primeiro passo em minha direção. Eu apenas fiquei esperando. Já tinha dito tudo que tinha a dizer, durante muito tempo. Agora, eu apenas estava ali esperando. E ele deu o primeiro passo, depois o segundo e percorreu toda a distância que o separava de mim. Pequenos dois ou três passos, muitas vezes, são mais difíceis e penosos de se percorrer que milhares de quilômetros sob o sol escaldante do deserto. E este era o deserto dele. Que ele teria que percorrer sozinho. E ele o fez. Me abraçou, mudo, em gesto, em seu abraço ele disse tudo que queria dizer e não sabia como.

Digo nada espero o vendaval passar
Por enquanto eu não sei o você me falou
Que me fez rir e pensar
Porque estou tão preocupado
Por estar tão preocupado assim

De repente eu estava com ele em meus braços. E fora tão simples. E era tão prazeroso. E estava em silêncio apreciando a minha conquista sobre mim mesmo, como um doente que consegue finalmente se livrar de um câncer. E eu me livrei do meu câncer, do meu preconceito. Agora eu estava livre, estava leve. Comecei a rir. Era tudo tão simples e eu complicando, complicando, complicando...

- Você tinha razão. É tão simples... porém é difícil, é como nascer, lindo, belo, simples, mas é impossível que aconteça sem dor.

Mesmo se eu cantasse todas as canções
Todas as canções, todas as canções
Todas as canções do mundo
Sou bicho do mato, mais...
Se você quiser alguém pra ser só seu
É só não se esquecer estarei aqui
Se você quiser alguém pra ser só seu
É só não se esquecer estarei aqui
Ou então não terás jamais
A chave do meu coração...


Eu queria cantar, eu queria pular, eu queria literalmente soltar a franga, mas apenas fiquei a seu lado, aconchegado no meu abraço. Porque os braços eram deles, mas o abraço era meu. Eu havia conquistado o direito de estar naquele abraço. Ele era meu. E veio no tempo certo. Veio no dia certo. Veio na hora certa. Eu queria um presente. Eu merecia um presente. Era meu aniversário, mas quem deu o presente fui eu. Dei o que tinha de mais precioso. A chave do meu coração!

Frase do dia
"A ignorância não fica tão distante
da verdade quanto o preconceito."
( Denis Diderot )

Enquanto isso... Na Sala do Recanto VI

Dite: Eu lembro dessa noitada... Mu e Shaka estavam maravilhosos, nunca vi o loiro daquele jeito. Camus sozinho cabisbaixo até a chegada de Milo. Esse Santuário...

Shaka: O que tem o Santuário?!?!?!

Mu: Que história é essa de achar o Shaka lindo? Isso é privilégio meu!

AA: Meninos... Vamos parar com isso já! *mostrando as fotos da reconstrução do Recanto* Querem fazer o trabalho todo de novo?

Mu, Shaka, Dite: Nãooooooooooooo!!! Vamos nos comportar!

AA: Ótimo, agora sentemo-nos para mais uma história!

Frase do dia
"Porque o arrependimento, como o desejo, não procura
analisar-se, mas sim satisfazer-se."
( Marcel Proust )

17 agosto, 2008

Apenas um Retrato

Minha primeira fic Milo X Camus, a que eu mais gosto e uma das mais desconhecidas. Publicada originalmente no ff.net em 26/10/2005. Está aqui com algumas alterações, mas ainda é minha fic querida!

Apenas um Retrato


Passaram-se apenas algumas horas que ele partira e eu já estava deprimido. Droga! Eu sabia que ele iria voltar em alguns dias, mas não consiguia imaginar passar algum tempo, por menor que fosse, longe dele. Já o perdi uma vez e sei o que é a dor da separação. De certa maneira eu procurei por nossa primeira separação. Eu pensei que ia esquecer, que tudo acabaria, mas descobri abobalhado que o amor transcende tudo, até mesmo a morte. Agradeço muito a Athena pela segunda chance que tivemos. Pude finalmente tê-lo a meu lado. Pude finalmente dizer a ele tudo que estava em meu coração. Precisava arrumar algo para fazer. Urgente!

A casa já está toda arrumada, tudo em seu devido lugar. Eu e meu maldito senso de organização. Se eu fosse um pouco mais desorganizado teria algo para ocupar meu tempo. Vasculhei livros e discos e nada, absolutamente nada me dá ânimo. Acho tudo tão estranho, eu nunca precisei de ninguém. Mesmo nos piores momentos eu sempre me bastei e agora, uma separação tola de uns poucos dias para que ele pudesse visitar algumas pessoas e resolver alguns problemas para a deusa me deixou assim, no mínimo, arrasado. Droga! Droga! Droga! Resolvi treinar um pouco, gastar um pouco de energia.

Desci as escadas correndo como um louco, precisava que me controlar para não derrubar nada nem ninguém. Meu corpo guardava uma energia erótica latente. Como sobreviveria aos próximos dias? Por Zeus! Que loucura é essa? Parecia um drogado em crise de abstinência! Quem sabe eu realmente não o seja? Quem sabe ele não seja a droga que me faz viver? Um banho frio. Grande idéia! Me diriji a cachoeira e deixei a água fria cair sobre minha cabeça, sobre meu corpo. A sensação é sem sombras de dúvida reconfortante. Por alguns prazerosos momentos me esqueci de tudo ao sentir o contato suave da água em meu corpo. Porém logo a água e sua carícia me lembrou dele. Droga de novo! Por quanto tempo ainda continuaria dessa maneira? Se eu permanecesse assim ficaria doente. Mas não seria bom ficar doente? Teria algo para preencher minha cabeça oca até que ele retornasse. NÃO! PARE! Sem idéias cretinas! De onde eu tirei isso? Que loucura!

Saí de dentro d’água e me sentei ao sol para secar. Olhei a paisagem ao meu redor e pela primeira vez me dei conta da beleza que me cercava. Nunca fui um homem preocupado com sentimentos ou com a beleza. Sempre achei que eles me enfraqueceriam. Mesmo quando fui arrebatado por esse louco amor ainda assim achava que era tolice. Não conseguia compreender os que se entregavam a loucura das paixões. E agora, que ironia, estou eu entregue a esta loucura. Paguei todos os meus atos e minhas palavras e sinceramente estou adorando, mesmo sofrendo, estou adorando. E se eu fosse atrás dele? Melhor não. Se ele não me levou é porque não quis ou não podia. Mesmo em épocas de paz ainda temos nossas obrigações. E, para ele, obrigação sempre foi uma coisa muito importante. Apesar do jeito aparentemente leviano, nada o afastava de seus objetivos e daquilo que acreditava ser o correto.

Já depois de seco resolvi voltar para casa. Como ficaria minha reputação se me vissem assim? Cara de bobo, deprimido, suspirando pelos cantos. Que belo cavaleiro eu estava me saindo. Comecei a fiscalizar novamente minha casa. Estantes de livros, cd’s e DVD's. Eu sempre considerei a minha casa meu paraíso particular, mas nada ali consegui me despertar do torpor que me arrebatara depois que ele partira. Lembrei-me do quarto dos guardados. Tudo que eu não mais usava mas não queria me desfazer estava lá, metodicamente organizado. Olhei displicentemente para as prateleiras, até que meus olhos pararam no bloco de folhas A3 ao lado da pasta que continha uma infinidade de materiais para desenho. Há quanto tempo eu não desenhava? Não me lembrava da última vez que riscara alguns traços no papel. Peguei o bloco, cujas folhas já estavam até amareladas pelo desuso e a pasta. Testei alguns materiais e pude perceber, com certo prazer, que ainda funcionavam perfeitamente. Achei um passatempo. Ufa! Senti-me mais aliviado. Creio que o pouco que sobrara da minha sanidade mental ainda estava preservado, mesmo que fosse apenas por algum tempo.

Sentei-me confortavelmente em uma poltrona estrategicamente colocada perto da janela de meu quarto, de frente para a grande cama de casal, meu orgulho e prazer. Olhei para a janela e mais uma vez me dei conta de como é linda a paisagem do Santuário, uma grande vista eu tinha do alto da montanha. O que desenharia, a vista da janela? Não! Simplesmente deixei o lápis deslizar por cima do papel branco, como se tivesse vida própria. Quando me dei conta, estava desenhando o retrato dele. Os longos cabelos cacheados sempre revoltos, esvoaçando com o vento. O nariz levemente arrebitado. Orgulho, arrogância e um quê sedutoramente inocente. Olhos grandes. Tudo desenhado! Pronto! Hora de dar cor e vida a esse desenho. Os tons azulados únicos dos cabelos e os olhos também azuis, a pele levemente bronzeada.

Quando me dei conta, a noite já chegara fazia muito e tinha uma horda de cavaleiros esmurrando minha porta. Bando de fofoqueiros. Fui atender antes que colocassem minha casa abaixo.

- Pensamos que tivesse errado na dose e se auto congelado.

- Sei... Vocês estavam mesmo é querendo ver como estou me saindo sem ele. Estou bem! Já viram! Fora!

- Aí galera, o mau humor continua o mesmo. Ele está bem! – Afrodite foi o primeiro a se manifestar.

- Eu não sou mal humorado! – protestei.

- Camus, você nunca foi mentiroso. Quando começou?

- Até você, Mu? – dei um suspiro resignado. Fiz a fama, agora eu que me aproveitasse dela. -Realmente sou um pouquinho mal humorado, mas só um pouquinho, que fique bem claro.

A gargalhada foi geral e eu com a mais patética cara de bobo que alguém pode fazer. Resolvi sair daquela situação saia justa e descobrir o que realmente levou aquela horda até a minha soleira.

- Afinal, o que você querem além de fofocar? O que vieram fazer aqui?

- Te chamar para sair conosco. Todos vamos ao Saint Dance. - Afrodite tomou a frente como porta-voz da turba.

- Sem ele?

- E por que não? Ora, ora Camus, não é para se enfiar em nenhum bordel, apenas dançar e beber um pouco, conversar...

- Tudo bem, se eu não for vocês não vão me deixar em paz mesmo. Esperem um pouco, vou me trocar.

- Assim que se fala meu amigo.

Peguei o desenho pronto que fora abandonado sobre a poltrona, datei, assinei e coloquei uma pequena epígrafe: “Te amo meu veneno, meu escorpião!”. Deixei novamente o bloco jogado, desta vez sobre a cama. Tomei uma rápida ducha, vesti uma calça vinho de brim e uma blusa preta, de linha bem fina, com decote em V. Simples e bonita. Eu sempre gostei muito dessa blusa. Confortáveis sapatos de couro preto, clássicos, afinal eu sou clássico, um relógio discreto. Escovei os cabelos e completei a produção com um detalhe que passara a usar, além da grossa aliança de ouro, por insistência dele, um brinco, uma pequena argola de ouro com um escorpião pendurado.

A peça era realmente linda e era uma marca. Este pingüim tem dono e não se importa nem um pouco em mostrar isso para quem quiser ver. Conferi o visual, me dei por satisfeito. Apaguei a luz, fechei a porta e saí. Noite lá vou eu! Que droga! Sozinho!

-- X -- X -- X --

Eu tive que sair. Aquela praga que nós chamamos de deusa me encheu de porcarias para resolver como se eu fosse um mensageiro qualquer. Que absurdo, um cavaleiro de ouro, a elite, fazendo trabalho de Office-boy. Ninguém merece! Creio eu que devo ter roubado os louros olímpicos na outra encarnação para ter tamanho castigo nessa. De quebra minha mãezinha querida ligou para o “Miluchinho da mamãe” exigindo minha presença sob ameaça de vir pessoalmente ao Santuário. Precisei realmente sair. Pensei até em levar meu geladinho junto, mas sozinho resolveria tudo bem mais rápido e poderia voltar para os braços dele. Como resistir a tentação de arrastar aquele homem perfeito para o primeiro motel que encontrasse pelo caminho? Melhor sozinho.

Disse que demoraria alguns poucos dias, mas se eu fizer tudo direitinho e utilizar um pouco de velocidade de cavaleiro, conseguiria voltar ainda no mesmo dia.

Saí de manhã atabalhoadamente – só pra variar – de casa. Adoro a minha casa. Ultimamente tenho vivido mais na casa dele que na minha, mas lá ele está sempre atrás de mim, organizando, arrumando, catando a minha tão primorosa bagunça. Chutei algumas mudas de roupa suja para o canto, peguei um confortável jeans, tênis de cano alto e uma camiseta de malha “mamãe sou gostoso”, prendi meus cabelos em um rabo baixo para que não me atrapalhassem. Fui correndo para a cidade. As frescuras de Athena foram fáceis de resolver. Nada que meu “jeitinho” não resolvesse. Ta certo que tive que limpar a mão na cara de um sujeitinho mas ele acabou colaborando comigo de boa vontade. Complicado mesmo foi a mamãe.

NA CASA DA MAMÃE

- Milucho, filhotinho, que saudade! Você está tão magrinho. Não tem comida naquele Santuário não? Vou pessoalmente reclamar com aquela deusa de araque!

- Mamucha, que exagero! Estou ótimo! Melhor impossível!

No fundo, no fundo, ao imaginar a cena da minha mãe dando um pito na Saori, fiquei em êxtase, se alguém era capaz de acabar com a banca da deusinha, esse alguém era a mamucha. Mas eu não sou louco de permitir algo assim. Imagine! Quando ela passasse pela minha casa ou encontrasse Camus, eu precisaria me esconder nas saias de Hades e mesmo assim era capaz dela me achar.

- Milucho, deixa de ficar ai com essa cara de bobo e vem comer. Enquanto isso me conta o que tem feito da vida. Quando você vai largar aquele branquelo desmilingüido e arrumar uma boa mulher pra casar? Essa palhaçada de vocês já foi longe demais. Até aliança você está usando! Você sabe que sempre vou te amar, mas você só está me dando desgosto.

Putz, esqueci de tirar a porra da aliança, agora o discurso vai ser longo...

- Mãe, eu já sou crescido. Eu resolvo a minha vida! Não vou me casar com mulher nenhuma.

Começou uma discussão básica. É sempre assim. Ainda me pergunto o porquê de não conseguir controlar o meu maldito gênio. Sanguezinho desgraçado esse do pessoal do Mediterrâneo! Deve ter alguma ligação com esse mar, esse sol, essas cores. Era só olhar para o Santuário, eu, Aiólia, Aiolos, Shura, Máscara, Saga, Kannon, explosivos, estourados, irascíveis, sedutores, charmosos, arrogantes, orgulhosos, que combinação linda!

O resto do meu dia na casa da mamãe foi uma tortura social, tios, primos, parentes próximos e distantes vieram ver o “Milucho da mamãe”. Na boa, estava me sentindo um macaco no zoológico. Somente perto da meia noite consegui espantar todos e voltar para o Santuário. Não via a hora de fazer uma surpresa para o meu pinguinzinho.

FIM DA CASA DA MAMÃE

NO SANTUÁRIO, MAIS DE MEIA NOITE

Quando cheguei ao Santuário, achei tudo muito silencioso. Cadê o povo? Onde a galera tinha se enfiado? Fazer conjecturas decididamente nunca foi o meu forte. Fui subindo as escadas, mãos nos bolsos, mochila nas costas, assoviando uma música da moda. Não fazia a menor idéia do nome, tinha ouvido na cidade e ficado com a melodia na cabeça.

Cheguei a minha casa e joguei a mochila com as encomendas da Saori e os “presentinhos” da mamãe displicentemente em um canto, amanhã eu cuidaria disso. Agora, outras prioridades. Pinguinzinho, ai vou eu!

Quando entrei em Aquário e também não encontrei ninguém, confesso que fiquei muito puto. Quer dizer que era só eu sair que o outro ia pra farra? Sem mim? Que abuso! Comecei a vasculhar a casa toda com a atenção de um escorpião ciumento. Em cima da cama encontrei o desenho. Merda! Me derreti todo! Estava perfeito! Quer dizer, eu sou perfeito e ele conseguiu passar isso para o papel! Um artista! Meu pinguinzinho era um artista! Se estavam todos na rua, só podiam estar em um lugar! Decidi fazer uma entrada triunfal. Digna de mim mesmo.

Tomei um longo banho, coloquei uma calça de couro preta que parecia uma segunda pele, botas pretas de bico e uma blusa branca de viscose, modelito século XVIII, com grandes babados nas mangas e no entorno da gola que vinha até quase meu umbigo. Uma escovada no cabelo para que ficasse metodicamente desarrumado. Algumas pulseiras de prata sobre o relógio. O brinco com a ânfora de aquário, um perfume cítrico amadeirado para arrasar, kajal preto nos olhos. Estava pronto! Montei na minha Harley vinho e Saint Dance, ai vou eu! Preparem-se para o veneno do escorpião. Sai para arrasar!

SAINT DANCE MAIS DE UMA E MEIA DA MADRUGADA

Droga! Nunca gostei muito de noitadas. Ultimamente venho freqüentando mais graças ao Milo, mas com ele até o inferno é agradável. Sem ele, qualquer lugar é o inferno. Bebi mais um gole de vodka. Se eu mantiver esse ritmo, daqui a pouco estarei completamente bêbado. Contanto que eu não resolva dançar Edith Piaf (1) novamente tudo ficará bem. Mais um gole. Pedi a todos os deuses que ninguém viesse atrapalhar minha dor de cotovelo. Eu não merecia isso! (até mesmo expressões do vocabulário dele eu já estou me apropriando, onde vou parar?)

Acho que realmente não é o meu dia, lá vinha um bêbado chato me importunar. Não queria arrumar confusão. Esperava que ele não me obrigasse a isso.

-- X -- X -- X --

Quando eu cheguei na boate, me certifiquei com o pessoal da entrada que estavam todos lá. Pensei um pouco (não riam, às vezes eu faço isso sim!). Como faria minha entrada triunfal? Decidi sondar o ambiente. Me misturei ao povo. Foi um pouco difícil, afinal eu quase não chamo a atenção (estou aprendendo um tantinho de ironia com o gelinho, um dia eu chego lá!). Observei. Dite e Máscara se agarravam num canto escuro. Shaka e Mú davam um show na pista. Não sei o que houve com eles mas a reconciliação fez muito bem aos dois. Deba estava de beijinhos com uma amazona – será que agora o grandão desencanta? O resto do pessoal fazia um rodinha que ocupava quase toda a pista de dança. Cadê o gelinho? Não o via em lugar algum.

Se não estava ao alcance de meus olhos, só se estivesse no banheiro ou em nossa mesa reservada. Entrei na área VIP e avistei a nossa mesa. Lá estava ele. Sozinho. Acompanhado apenas de seu copo de vodka. Me deu um apertinho no coração. Rapidamente apagado pela enorme felicidade de constatar que ele estava realmente sozinho. Escorpiano ciumento e possessivo, mas sabem como é: o que é meu, é meu! E ai de quem chegar perto! Ninguém pode meter os olhos, muito menos as mãos.

Quando ia me encaminhar para a mesa, tive meu braço agarrado por um amigo. Na hora me veio uma idéia genial. Encontrara a minha entrada triunfal.

- Damien, como vai? Como estão as coisas?

- Bem, e com você sumido? Está melhor que nunca!

Sorri, meu ego se inflou mais (se é que isso é possível – também sei fazer mea culpa). Sei que sou lindo, mas nada melhor do que ouvir isso. Gastei algum tempo conversando, falei de Camus e pedi que ele se aproximasse. Contei meu plano.

- E se ele me congelar?

- Não fará isso. Estarei por perto! – todos que freqüentavam a Saint Dance nos conheciam e sabiam de nossos poderes.

Damien não se prontificou a me ajudar imediatamente, precisei usar de alguns argumentos persuasivos básicos, afinal ele me devia alguns favores, mas no final ele me ajudou de “boa vontade”. Fiquei observando enquanto ele se aproximava de Camus, se fingindo de bêbado.

-- X -- X -- X --

- E ai, por que está sozinho, bonitão?

Droga! Bêbado mais cantada barata, o que ainda me faltava acontecer naquela noite? Por que não fiquei em casa?

- Não estou sozinho! – era óbvio que eu estava sozinho. Até um bêbado podia ver isso, mas desde que eu comecei a namorar Milo, mesmo sem ele, eu estou com ele. É assim que funciona. Eu estou acompanhado do escorpião que carrego na orelha.

- Não estou vendo ninguém com você. – o cara foi falando e puxando a cadeira para sentar-se ao meu lado. Eu estava começando a ficar irritado.

- Não é porque você não está vendo que minha companhia não exista.

- Hi... o cara namora um fantasma... Não é melhor um cara de carne e osso como eu?

Pronto! Agora não consegui mais me segurar. Meu cosmo começou a se elevar, nesse momento fui abraçado por trás. Mais um engraçadinho eu não suporto! O ar frio começou a circundar o espaço a minha volta. Quando já estava pronto para lançar uma “execução aurora” ouvi uma voz:

- Você não o ouviu dizer que estava acompanhado? Suma daqui se não quiser encrenca!

Aquela voz! Aquelas mãos perfeitas! O perfume! Milo! Ele estava ali! Agora a noite realmente iria começar.

- Milo! Eu não acredito... mas... como...

- Psiu! Sua companhia atrasou um pouco mais chegou!

Eu não queria saber como ou o porquê, o puxei para mim e beijei aqueles lábios como desejava fazer desde que ele deixou o Santuário pela manhã.

- Agora a noite pode começar!

-- X -- X -- X --

Quando Damien se aproximou de Camus cheguei bem perto dele por trás. Eu estava fora de seu campo de visão, usando toda a minha concentração para esconder meu cosmo, não foi muito difícil, eu vinha fazendo isso desde que colocara meus pés dentro daquela boate. Fiquei somente ouvindo. Damien jogou a cantada barata que havíamos combinado e esperei a reação de Camus. Não foi exatamente a que eu esperava, para ser bem sincero foi a que eu queria, não a que eu esperava. Meu gelinho sempre fora um homem educado, fino. Eu realmente não esperava dele tamanha agressividade. Confesso que adorei! Ganhei o dia! Depois da visita a mamucha não poderia esperar nada melhor!

Senti o momento exato que o cosmo dele começou a se expandir. Ele não fez nenhum esforço para esconder. A hostilidade era clara e latente. O ar a nossa volta gelou! O abracei por trás, ainda escondendo o meu cosmo, deixei que ele me reconhecesse por outros sinais: voz, mãos, cheiro. Mais uma vez ele não me decepcionou. Perfeito! Tudo Perfeito! Ele ainda tentou conversar. Tentativa tola e vã (caracoles estou filosofando igual a ele, acho que estamos andando demais juntos!). Rapidamente ele esqueceu as palavras e me puxou para um beijo. Que delícia de beijos. Quero mais! Quando ele finalmente me soltou brinquei:

- Agora a noite pode começar!

Sabem, eu preciso contar... quer dizer, eu preciso contar em parte... poderia passar horas descrevendo tintim por tintim como foi a noite, mas por enquanto até aqui basta. Quem sabe outra hora eu o faça. Aquela noitada tinha tudo para ser um desastre. Daqueles bem catastróficos mesmo, tamanho o meu ciúme. Sabem como é... tem-se que fazer um desconto para pessoas como eu. Quando eu não o achei no Santuário falei que fiquei puto, mas na verdade eu fiquei realmente enfurecido tamanho o meu ciúme e a minha sensação de abandono. Uma observação: não queiram me ver enfurecido. Mas aquele desenho... se ele soubesse...

Uma das nossas melhores noites, uma das mais perfeitas que sou capaz de me lembrar, foi salva por um retrato. Apenas um retrato.

(1) Referência a fic "Quebrando o Gelo" de Caliope Amphora

Frase do dia
"Vale mais romper de uma vez que
alimentar permanente suspeita."
(Julio Cesar)

16 agosto, 2008

Enquanto isso... Na Sala do Recanto V

MM: Eu gosto dessa história, me trás boas recordações!

AA: E desde quando você tem boas recordações?

MM: Nem tudo é o que parece. Os brutos também amam!

AA: Credoooooooooo, isso parece comercial de CD antigo.

MM: Grunf!

AA: Bem melhor, esse é o MM que eu conheço.

Dite: Começou a contar as histórias em UA, querida?

AA: Estou escolhendo as histórias mais antigas, one-shot. Depois eu começo a contar as histórias em capítulos e primeiro as já acabadas.

Dite: Nosso mural está ficando lindo... mas essa decoração...

AA: Não se mete! Não perguntei nada!

Dite: Grossa!!!

AA: Alguém aqui nesta espelunca tem que ser e parece que MM fugiu do posto.

MM: *olhando em volta* Acho que Dite tem razão... vou começar a quebrar algumas coisas por aqui para melhorar a decoração.

AA e Dite: Nãoooooooooooooooo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Frase do Dia

"Você perde 100% dos tiros que você
nunca dá."
( Wayne Gretzky )

Avesso

Esta fic foi postada originalmente no ff.net em 19/04/2006. É uma short-fic, song-fic. Esta música é muito especial pra mim e não consigo ver outro casal para esta trilha sonora além de Afrodite e Death Mask. Esclarecendo e dando os devidos créditos. A música é "Avesso" de Jorge Vercilo.

Avesso


Eu já não sou mais nenhum adolescente. Te conheço desde sempre. Não sei em que momento eu comecei a amar-te. Hoje te amo mais que a mim mesmo. Não foi fácil aceitar.

No momento que soube e percebi que meus olhos só brilhavam para você, entrei em crise. Não me aceitei. Não queria. Você é belo como o luar. Muitas vezes obscuro como a noite. Eu sou claro como o dia. Andrógeno como meus próprios sentimentos. Mas o que posso fazer? Eu sou o que sou. Não posso nem quero mais negar. Lutei, lutei, lutei em vão. Então me aceitei e agora sou feliz, ou quase, porque ainda não tenho você.

Sentei-me em um bar qualquer. Já sou adulto o suficiente para ir a bares, como sei que também o é. Um garçom se aproximou.

- A senhorita deseja alguma coisa?

Virei-me para ele e vi o desconserto em sua face ao perceber o engano. Sorri com complacência. Esse engano era natural. Eu muitas vezes já me peguei me olhando no espelho e vendo uma “senhorita”.

- Me desculpe. O senhor deseja algo?

- Não precisa se desculpar. – falei de forma natural, sem afetação – Por favor, um wisky duplo, sem gelo.

- Em um instante.

Impaciente, tamborilei a mesa com os dedos enquanto esperava minha bebida. Será que você viria? Apesar de nossa amizade ser longínqua, sei que hoje evita estar comigo. Tem medo? Não posso dizer. Não sei. Só sei que a distância me dói mais do que tenho coragem de admitir para mim mesmo. O som suave tocava músicas da moda. Eu não prestava atenção até que começou a tocar algo que me despertou a atenção. O autor me conhecia? Nos conhecia?

Nós já temos encontro marcado
Eu só não sei quando
Se daqui a dois dias
Se daqui a mil anos
Com dois canos pra mim apontados
Ousaria te olhar, ousaria te ver
Num insuspeitável bar, pra decência não nos ver
Perigoso é te amar, doloroso querer
Somos homens pra saber o que é melhor pra nós
O desejo a nos punir, só porque somos iguais
A Idade Média é aqui
Mesmo que me arranquem o sexo, minha honra, meu prazer
Te amar eu ousaria
E você, o que fará se esse orgulho nos perder?

No clarão do luar, espero
Cá nos braços do mar me entrego
Quanto tempo levar, quero saber se você
É tão forte que nem lá no fundo irá desejar
O que eu sinto, meu Deus, é tão forte!Até pode matar
O teu pai já me jurou de morte por eu te desviar
Se os boatos criarem raízes
Ousarias me olhar, ousarias me ver
Dois meninos num vagão e o mistério do prazer
Perigoso é me amar, obscuro querer
Somos grandes para entender, mas pequenos para opinar
Se eles vão nos receber é mais fácil condena rou noivados pra fingir
Mesmo que chegue o momento que eu não esteja mais aqui
E meus ossos virem adubo
Você pode me encontrar no avesso de uma dor
No clarão do luar, espero
Cá nos braços do mar me entrego
Quanto tempo levar, quero saber se você
É tão forte que nem lá no fundo irá desejar

Eu cantarolei junto ao cantor. Nosso caso estava ali. Eu estava ali. De frente pra mim mesmo. Era o meu espelho. Era o nosso espelho. Vejo você entrar. Lindo. Belo. Rebelde e forte como sempre.

- Afrodite...

- Não diga nada. Não se justifique. É bom que esteja aqui. É bom poder vê-lo. Ao menos uma última vez.

- Por que uma última vez? Não me quer mais?

Eu sorri. Seria impossível não querê-lo mais, a não ser que não quisesse mais a mim mesmo. Sorri e me mantive em silêncio. Esqueci até mesmo de respirar enquanto me hipnotizava por seus olhos.
- Não sei quanto a você, mas eu não agüento mais esconder. Eu não agüento mais tanta hipocrisia. Que tudo, que todos vão às favas. Eu sou teu, se assim o quiser.

Continuei em silêncio. Apenas coloquei minha mão sobre a dele e sorri. Minha bebida chegou. Um gole. Dois. Via seu olhar confuso a me espreitar.

- Cáspita. Não vai falar nada?

- Pra quê falar? Não tenho necessidade de palavras. Elas são vãs, são fúteis. Eu te amo. Eu te quero, fui, sou e serei seu, então pra que falar? Vamos apenas jantar, como bons amigos e sair daqui juntos para o futuro. Que lhe parece?

Ele apenas me olhou e chamou o garçom.

- Por favor. Lasanha para dois, uma garrafa de vinho. – se virou para mim – Vamos jantar. Estou faminto.

Quando se ama, se espera e não se precisa de palavras. Palavras voam com o vento...

Frase do Dia

"A ação é uma grande restauradora e
construtora da confiança. A inatividade não só é o resultado, mas a causa do
medo. Talvez a ação que você tome tenha êxito; talvez uma ação diferente ou
ajustes terão de ser feitos. Mas qualquer ação é melhor que nenhuma."
( Norman Vincent Peale )

15 agosto, 2008

Enquanto isso... Na sala do Recanto IV

Saga: Eu não acredito, o que essa história está fazendo aqui?

AA: Cavaleiro, você está sendo preconceituoso, isso é muito feio, sabia?

Saga: Não é preconceito, mas esta história não combina com este blog.

AA: Claro que combina. Faz parte das histórias do Santuário. Este espaço é aberto a tudo que for escrito com um mínimo de qualidade sobre vocês. Não só por mim, mas por qualquer pessoa que queira ver sua história em nosso mural.

Saga: Isso não é bom... Algo me diz que ainda vou me ferrar...

AA: Não fique mal humorado, o Shura já está chegando. Acabou de avisar por cosmolular que não demora muito.

Saga: E por que não avisou a mim?

AA: Acho melhor perguntar diretamente a ele.

O Cavaleiro de Gêmeos quase teve um ataque mas lembrou-se da última briga e da obra de reconstrução do Recanto, pensou melhor e decidiu pegar um cerveja gelada.

E assim, mais uma história foi para o mural do Recanto. E... nem só de yaoi vive o nosso Recanto!!!

Frase do dia

"Toda arrogância é odiosa, mas
a arrogância do talento e
da eloqüência é uma das mais desagradáveis."

(Cícero)


Nem só de Yaoi vive o Recanto

Fic postada originalmente em 07/06/2006 no ff.net com o nome de "Cego de Amor"

Cego de Amor


Finalmente eu estava voltando para casa. Meu corpo estava destruído. Cada pedaço de mim doía. Mas o que mais doía era a minha alma. Ver a morte de meus companheiros, ver a luta, ver a dor... Não havia treino que nos preparasse para isso.

Eu estava com saudades, eu estava me sentindo uma criança precisando de seu porto seguro e ela era o meu porto seguro. Se alguém poderia curar minha alma, muito mais que meu corpo, este alguém era ela.

Mas eu tinha medo. E se ela não me quisesse? E se ela já estivesse com outra pessoa? Nem mesmo sei se ela foi avisada. Não imagino se ela sabe que sobrevivi. E se sobrevivi, não foi por Athena, não foi nem mesmo pelos meus amigos. Se sobrevivi foi por ela. E agora, faria o possível e o impossível para torná-la minha de verdade.

Me aproximei de sua casa, de nossa casa. Escondi meu cosmo, ela era capaz de reconhecê-lo a distância. Foi ensinada a isso. Assim poderia reconhecer um cosmo hostil.

Tinha alguém com ela? Quem seria? Quem estaria na minha casa, com a minha mulher? Mesmo que não tivéssemos nos casado ainda, ela sempre fora minha, assim como eu sou dela. Quem estaria ali?

Precisei utilizar todo meu auto-controle para não explodir em fúria, antes mesmo de saber o que estava acontecendo. Eu não era como alguns de meus companheiros que, no mínimo já teriam destruído toda a casa. Entrei sorrateiramente e percebi que não havia ninguém na sala e que meu quarto estava arejado e perfumado, como se estivesse esperando meu retorno. Eu já me acostumara a ver sem enxergar e pude perceber satisfeito que nada havia sido modificado.

Coloquei a bolsa que carregava sobre a cama que costumava usar. Voltei para sala, sentei-me no sofá e só então deixei que ela percebesse que eu estava ali. Que eu havia chegado. Ouvi o barulho de louças quebrando. Ela havia se assustado com minha súbita aparição. Eu não conseguia me decidir se istp era um bom ou mal sinal. Ouvi uma voz masculina e preocupada.

- Querida, o que houve? Você se machucou? Deixe que eu limpo esta sujeira. Acalme-se.

Querida? Que merda era aquela? O que havia acontecido em minha ausência? Paciência oriental era o cassete! Meu cosmo começou a se expandir. Eu estava pronto para destruir aquele desgraçado, quem quer que ele fosse, que ousou chegar perto da MINHA mulher e ainda chamá-la de querida. Não se podia virar as costas por uns míseros meses que já vinha outro querendo seu espaço? Ele estava salvando o mundo, porra! E o mundo querendo lhe roubar a única pessoa que ele realmente amava? Era o cassete! Não iria entregá-la de bandeja de maneira nenhuma.
Concentrava-se para encontrar a energia daquele que usurpou seu lar. Não foi difícil. Ele não fazia questão de esconder-se, ou será que não fazia idéia do perigo que corria? Ele talvez não soubesse, mas ela o conhecia bem e sabia do que era capaz. Tanto sabia que veio correndo ao meu encontro, segurando meus braços.

- Shiryu, pare com isso agora! O que pensa que está fazendo?

Não me dignei a responder. Virei meu rosto na direção que sabia ser a porta. Pude sentir a pessoa parada na porta. Seu medo era latente. Palpável. Ele devia me conhecer, ao menos de nome. Ela deveria ter falado de mim para ele. Eu podia sentir seu medo. Ela o havia trocado por um covarde? Algo não encaixava. Mas não podia ver. Não podia ver o rosto daquele que havia tirado de mim a única chance que tinha de felicidade. Baixei o cosmo e sentei-me desolado no sofá.

- Shiryu, não imagina como estou feliz em vê-lo novamente, vivo, bem.

- Será que está mesmo feliz em me ver? Não parecia infeliz, antes.

- Não seja injusto ou amargo. Eu não mereço isso de você.

- Não merece! Como pode falar em merecer com tanta propriedade! E eu! Eu mereço voltar para casa e encontrá-la com outro homem? Eu mereço isso depois de tantas batalhas? Meu corpo nem mesmo teria esfriado, se eu tivesse morrido e você já enrabichada por outra pessoa. Me diga, Shunrei, me diga com sinceridade, eu mereço?

Percebi que ela me olhava, sinti o olhar dela sobre mim.

- Shiryu, você está cego novamente?

- O isso importa? Você mesma me ensinou que isso não era importante, você mesma, um dia me pediu que aqui ficasse, que você seria meus olhos...

- Então deixe-me cumprir minha promessa. E quero que veja, com seus próprios dedos, a pessoa que você me acusa de ter colocado em seu lugar.

Ela me conduziu até o homem. Eu não estava entendendo absolutamente nada. Ela iria me apresentar a ele? O que ela pretendia com isso?

- Pode ficar tranqüilo, ele não irá feri-lo, mas por favor, o deixe tocá-lo, ele não pode vê-lo.

Ouvi o suspiro de alívio dado pelo homem. Ela colocou meus dedos no rosto dele. Deixei meus dedos passearem calmamente por aquela pele enrugada e pastosa. Peraí, enrugada e pastosa? Eu estava diante de um velho. Estava diante de um ancião! Deixei minha mão para a cabeça, e onde eu esperava encontrar uma farta cabeleira, como eu mesmo tinha, senti a pele lisa com um ou outro fio de cabelo. Minha cara de susto deve ter sido no mínimo hilária. Eu estava prestes a atacar um velho. Mas de qualquer forma, quem era ele? E o que ele estava fazendo ali?

- Shiryu meu filho, que bom que está vivo e bem e voltou para nosso convívio. Não sabe como pedi a Buda que nos desse tamanha graça.

- Quem está ai? Quem é o senhor?

A voz não me era estranha, mas eu não conseguia identificar. Não conseguia ligar aquela voz a nenhum conhecido. Mas estava óbvio que ele me conhecia e bem. Eu ficara completamente confuso. Pelo visto acabara de dar uma tremenda mancada. Isso sempre acontecia quando eu perdia a paciência e mais ainda no que dizia respeito a ela.

- Não está me reconhecendo? Era de se esperar, há muitos anos não me vê. Creio que desde que era garoto e intensificou seus treinamentos em busca da armadura de Dragão. Eu sou o Ancião da Aldeia. Desde que Shunrei ficou sozinha aqui venho visitá-la. Muitas vezes a chamei para ir morar na aldeia em minha casa, com minha esposa e minha família, mas ela sempre soube que você voltaria e te esperou dia após dia. Me desculpe se te ofendi de alguma maneira, não era essa a minha intenção e sim zelar por esta menina que é tão querida para mim como minhas netas.

Realmente a mancada que eu havia dado tinha sido digna do Seyia. Quer dizer, acho que nem mesmo ele era capaz de tamanha asneira. Me ajoelho aos pés do Ancião da Aldeia.

- O senhor é que tem que me perdoar. Estou há tanto tempo longe de casa, longe das pessoas, no meio das lutas, que parece que me esqueci da cortesia, das boas maneiras e do respeito. Peço humildemente que perdoe meu comportamento tolo e que receba meus agradecimentos sinceros por ter cuidado de Shunrei com tanto zelo em minha ausência.

- Levante-se meu jovem. Talvez eu fizesse o que fez em seu lugar. Agora posso voltar para a aldeia em paz e tranqüilo. Minha menina ficará bem e protegida junto àquele que ama. Mesmo que não possa ver com os olhos, pude perceber que é bastante apto para mantê-los em segurança. E seu mestre? Ele voltará?

- Infelizmente meu Mestre não sobreviveu. – uma lágrima furtiva escorreu de meu olhos ao lembrar de meu mestre.

Shunrei se agarrou a mim e chorou copiosamente em meu peito. Dokho era para ela como um pai ou como um avô. Papel que ultimamente vinha sendo feito pelo Ancião da Aldeia. Fiz um carinho em sua cabeça. Tentei consolá-la. Mas nada falei. Deixei que ela fosse se acalmando naturalmente.

- Eu sabia que isso ia acontecer. É o destino de todo guerreiro, morrer por uma causa. Pelo menos você está vivo. É o destino de toda mulher de um guerreiro viver dia após dia com o coração aos pulos, orando aos deuses pela vida de seu amor. Este é o meu destino.

- Eu te amo tanto minha pequena, se eu pudesse mudaria nosso destino, mas não posso. Sou um guardião da Deusa Athena. Creio que, talvez, o Mestre retorne. A Deusa está tentando tudo para trazer de volta os Cavaleiros de Ouro. Oremos juntos para que ela consiga. Mas agora eu queria ficar ao seu lado. Queria que você se tornasse minha. Queria que se casasse comigo.

- Casar com você? Isso é muito mais do que eu sempre sonhei. Este é o meu maior desejo.

- Vamos ser felizes juntos, minha pequena. Não sei se um dia precisarei voltar a lutar, mas quero passar a seu lado cada pequeno momento feliz de paz que eu puder ter. Eu sei que é muito egoísmo de minha parte te pedir isso. Mas fique comigo, seja minha.

Shunrei calou-me com um beijo doce, suave e casto.

- Eu sou sua. Sempre fui e sempre serei...

Seis meses depois, na mansão Kido

- Quer dizer que nosso Cavaleiro de Dragão virou Cavaleiro de Dragão de Gaiola?

- Seiya, de onde você tirou isso? – perguntou Ikky as gargalhadas...

- Ora nosso dragãozinho foi devidamente domesticado e estamos presenciando a cerimônia de enclausuramento, digo casamento.

- Olha quem fala... Deixa a Saori ouvir isso pra você ver o que vai te acontecer...

- Vira essa boca pra lá, Shun... se ela ouve viro é Cavaleiro de Pangaré...

-Como se já não o fosse... – alfinetou Ikky mas em tom de brincadeira.

Saori conseguira reviver todos os Cavaleiros de Ouro. Dokho fazia as vezes de pai de Shunrei, afinal ele criara a menina. A cerimônia foi singela e bela, dentro dos moldes do casamento chinês.
Todos depois foram festejar na mansão... Os noivos não viam a hora de fugir daquele manicômio que se tornara a Mansão Kido.

- Por todos os Deuses, você pode me explicar o que está acontecendo aqui, meu amor...

- Todos nós perdemos nossa infância, nossa adolescência e até mesmo a vida lutando por uma causa. Agora estamos tendo a chance de viver novamente e cada um, de sua forma, está tentando viver tudo que perdeu da melhor e mais intensa maneira possível. O resultado é este que você está vendo... – Shiryu respondeu esticando a mão.

- Mas e você, porque não está lá festejando com eles...

- Digamos que agora eu estou imaginando um outro tipo de festa... – ele agarrou a esposa e lhe deu um longo beijo – Uma festa à dois, que tal?

- Perfeito...

A puxei pela mão e discretamente fugimos pela porta dos fundos. Só fomos vistos alguns meses depois no Santuário, quando Shunrei foi exibir o troféu de sua felicidade. A, já pronunciada, barriga que acalentava o nosso primeiro herdeiro.


Frase do Dia


"A liberdade de amar não é menos sagrada que a
liberdade de pensar. O que hoje se chama adultério, há muito tempo se chamou heresia."

( Victor Hugo )

14 agosto, 2008

Enquanto isso... Na Sala do Recanto III

Shaka: hahahahahahahaha Quer dizer que foi o sr. Gelado que tomou a iniciativa?

AA: Não foi bem assim, Shaka...

Shaka: Não ponha panos quentes...

AA: Eles não estão aqui para se defender.

Shaka: Estão "descansando" no andar de cima... E diga-se de passagem, que "descanso" barulhento.

AA calou-se e resolveu pegar outro copo de refrigerante, afinal não era surda. Ainda bem que mandara fazer as camas de alvenaria ou teria uma conta infindável na loja de móveis. Cavaleiros... aff
Frase do Dia
"Se os macacos soubessem aborrecer-se, poderiam
tornar-se homens."( Johan Wolfgang Von Goethe )

Vinho Antigo

Fic postada originalmente no ff.net em 01/10/2006, afinal não é só de Mu e Shaka que o blog é feito. A música incidental é "Vinho Antigo" do Dalto.



Vinho Antigo



Eu estava sentado, sozinho em minha casa, olhando o tempo passar e lembrando do passado. Uma ruga de preocupação se formou um minha testa, uma nuvem de tristeza nublou meus olhos. Por que eu fazia isso comigo mesmo? Entregava-me a momentos de autopiedade, com uma morbidez digna de livros de Sade. Fechei meus olhos. Como eu queria poder chorar, como eu queria conseguir chorar. Eu nunca soube o que eram sentimentos então, por quê agora? Por que me obrigava a recordar cada ferimento, cada angústia, transformando tudo em um pesadelo constante e amargo?

Lembrei-me da primeira vez que eu morri, lembrei-me do peso da Sapuris, lembrei-me de estar contra você. Uma chaga, que fora aberta em meu peito e que eu sabia que nunca se fecharia tornou a sangrar. Eu cansei de apontar as fraquezas de outrem e não conseguia lidar com minhas próprias fraquezas. Eu precisava de um bálsamo. Eu precisava de você.

Sabe você um jeito todo especial
quando diz "te amo"
Fica com ar de quem amou
E foi a primeira vez

Meus pensamentos tomaram um novo rumo. Você. Seus olhos tão azuis, seus cabelos longos, sua tez infantil que conseguia ser dura e cruel quando necessário. Seu jeito muitas vezes despojado que fazia com que me sentisse amado, desejado e principalmente bom. Somente a sua voz suave nos momentos de amor, a me dizer “te amo”, tinha a capacidade de estancar o sangue que sempre teimava em jorrar dentro de mim, fazendo com que eu me enfraquecesse nesta eterna hemorragia.

A cada dia que passava eu me fechava na minha concha de gelo e te afastava de mim. Eu não te merecia, mas te queria. Como poderia ser tão cruel e egoísta a ponto de impingir a você o peso de meus atos?

Você foi o melhor dos sonhos
O melhor do meu passado
Sabe amor eu vou querer você
Sempre do meu lado

Em algum momento de minha vida eu acreditei que poderíamos ser felizes. Acreditei que seria possível um futuro. Eu sonhava com seus beijos, sonhava com seu corpo. Seu sorriso puro povoava meus pensamentos, muitas vezes em momentos completamente impróprios. Afastei-me de ti como se fosses um câncer que me consumiria se não fosse estirpado. Fui completamente idiota. Você me dava forças e eu não via. A cada briga, eu me afundava mais em meu próprio mar de lama. Por todos os deuses, como pude ser tão obtusamente cego?

Ainda teríamos tempo? O passado poderia ser realmente perdido nas brumas do esquecimento? Eu poderia realmente ter o seu amor de volta? Tantos pensamentos redundantes me fizeram decidir que lutaria mais uma vez, entretanto, desta vez, lutaria por algo realmente precioso. Lutaria por seu amor. Lutaria por nós dois.

Sabe você tem alguma coisa
Que me faz sentir eterno
Tem esse calor que me aquece
E me protege do inverno

Desde que retornamos a essa vida, por benevolência dos Deuses, tens tentado aproximar-se de mim. Sua persistência em me mostrar que somente o amor é capaz de nos tornar invencíveis tem, pouco a pouco, conseguido quebrar a minha geleira. Eu, o ser de coração frio e cosmo gelado, venho sido aquecido por você constantemente. Meu inverno tem paulatinamente sido espantado por uma primavera de dias ensolarados e felizes e fico aqui, igual uma mula teimosa, tentando manter este inverno despropositado em minha vida.

Chegara a hora de mudar as coisas. Chegara a hora de parar de me culpar e me permitir gozar plenamente da dádiva que me foi concedida. Um sorriso escapou das grades da tristeza e veio à tona iluminar meu semblante.

Você é como vinho antigo
Tem um sabor tão diferente
Sabe amor o que importa
É o que a gente sente

Levantei-me do trono de tortura que criara para mim mesmo e me encaminhei para minha adega. Escolhi uma bela safra, bebida antiga, feita com cuidado e amor, própria para marcar um recomeço, um verdadeiro renascer. Não mais teria medo de mim mesmo, não mais permitiria que meu sentimento de culpa impedisse a nossa felicidade. Obriguei-me a aceitar que só posso ser feliz a seu lado e que você me ama de tal forma que sua felicidade estava intrinsecamente ligada a minha.

Abri a garrafa sozinho e o líquido vermelho deslizou para a taça de cristal em uma dança sensual e inebriante. Dei o primeiro gole e um calor bem-vindo tomou meu corpo de assalto. Era um sabor puro e especial que estava destinado ao meu paladar. Assim como você. Este seria o meu último instante de solidão, caso você ainda me quisesse. Sinceramente eu desejava que ainda houvesse tempo. Acabei de degustar o meu vinho com um ânimo completamente diferente. Era tão maravilhosamente perfeito apreciar as coisas boas que a vida pode nos oferecer tendo enterrado o peso da culpa! Você, o tempo todo tentando me mostrar a verdade límpida que estava diante de meus olhos. Só agora pude perceber que para recomeçar é preciso chegar ao fundo do poço.

Procurei-te com meu cosmo. Estava próximo. Levantei-me, caminhei até onde se encontrava. Ainda levava comigo uma taça com o precioso líquido. Estendi a você, sem uma palavra dizer.
Segurou a taça com um olhar de dúvida.

- Por que?

- Por que eu te amo. Se ainda estiver disposto, fique a meu lado.

A taça desprendeu-se de suas mãos se espatifando no chão. Pulou em meu pescoço me enchendo de beijos, lágrimas de felicidade saiam de seus olhos. Sorri. A felicidade realmente era muito simples. Beijei-te novamente. Agora de verdade. Agora com meu coração descongelado para sempre.
Frase do Dia
"Um homem nunca te diz algo até que você o contradiga" (George
Bernard Shaw)

13 agosto, 2008

Repetindo Post

Nos últimos dias temos assistidos estarrecidos mais uma avalanche de
violência desordenada. Só me pergunto o porquê de ainda usarmos a palavra
estarrecidos, assustados, assombrados, horrorizados ou qualquer outro adjetivo
que o valha. Estas eclosões pontuais de violência, a meu ver, nada mais são que
explosões da válvula de segurança da panela de pressão que vivemos. Tenho mesmo
medo é do dia que esta panela explodir realmente com toda sua fúria.Durante
algum tempo participei da militância política, crendo, em minha inocência, que
talvez pudesse fazer diferença. Tolices infantis de uma alma sonhadora. Ainda
creio que talvez possa fazer diferença, mas educando, falando, criticando.
Participar da política institucional deste país nada mais é do que participar de
uma falácia tola e sem sentindo.Ainda tenho idéias e convicções de esquerda.
Nunca deixarei de tê-las. Acredito na igualdade, acredito na justiça social,
acredito na educação e aguardo, dia após dia, o fim do capitalismo, assim como a
história já assistiu ao fim dos grandes impérios MERCANTILISTAS, ao fim do
regime feudal, ao fim do comunismo stalinista e está vendo o fim do comunismo
chinês.Ainda creio em uma terceira via. Com a globalização, a fusão de idéias e
culturas, crenças e valores, ainda creio que se haverá uma terceira via. Só
espero que ela aconteça antes que a panela exploda de vez e só reste a nós catar
os cacos do que sobrar e limpar a sujeira.Mas tudo que estou falando não passa
também de um discurso pseudo-intelectualóide como os que eu tanto critiquei
quando me deseludi com o Partidão e chutei o balde da política.Se alguém chegou
até aqui deve estar se perguntando o porquê então deste post.Antes de mais nada,
e de volta ao começo, temos que tirar o véu de indignação politicamente correta
da frente dos olhos e ver que convivemos, dia após dia, com uma violência muito
mais cruel que sei lá eu quantos mortos numa onda de revolta. Vivemos com a
violência da opressão do nosso direito de mudar. Estamos com as mãos atadas
pelas contas, pela falta de tempo, pela ignorância, pelo medo da "pequena"
violência que nos atinge muito mais e nos consome sem que ao menos nos déssemos
conta disso.A cada dia mais nos encastelamos em nosso próprio microcosmo,
olhando cada vez mais para o nosso próprio umbigo em busca do "pão nosso de cada
dia", pedindo a Deus, implorando por um milagre que não vem. Estamos sendo
egoístas. Não! Estamos apenas tentando sobreviver da melhor maneira possível com
aquilo que nos é dado.Cada vez que pens sobre isso me pego questionando-me, se
pensa que sabe onde está o problema, porque não vai atrás das soluções?Eu não
tenho soluções mágicas. Não existem soluções mágicas. Creio que está na hora das
pequenas soluções e dos pequenos milagres do dia a dia. Da mãe que leva seus
filhos para a escola mesmo não acreditando poder livrá-los dos tentáculos do
crime. Do pai que mesmo exausto depois de 12 horas de serviço e mais outras
tantas em conduções torturantes para chegar em casa ainda encontra ânimo para
afagar seu filho e ouvir suas besteiras infantis. Dos tolos como eu que ainda
perdem tempo falando aquilo que todo mundo já ouviu, mas nunca prestou atenção.
Do faminto que ganha um pão e o divide com o faminto do lado.Convido a todos a
participar do movimento em busca do pequeno milagre e repudiar todo aquele que
disser que é tolice, estupidez ou utopia acreditar que ainda podemos
mudar.Convido a todos a ter esperança, mas não a esperança de que um Deus, um
homem ou um governo possam reverter a situação e sim a esperança de que, mesmo
que em doses homeopáticas, cada um possa, paulatinamente, mudar sua própria
realidade e, consequentemente, a realidade daqueles que o cercam.E que os
corruptos, os inescrupulosos, os verdadeiramente egoístas, sejam eliminados do
nosso convívio e da nossa aceitação.Eu mesma rezo pela cartilha do "farinha
pouca, meu pirão primeiro", mas, mesmo assim, nunca seria capaz de destruir algo
ou alguém deliberadamente só para ter uma vantagem ilusória, porque mais dia,
menos dia, eu acredito que teria que pagar o preço dos meus atos. Não por
justiça divina, ou obra e graça do espírito santo, e sim porque toda ação gera
uma reação de igual tamanho e grandeza.Me perdoem o desabafo, a falta de graça e
de humor, tão característicos meus, deste post, mas não podia ficar calada
perante o que vejo tão claramente acontecer diante de meus olhos. Mesmo que
ninguém leia, ou que ache tudo isto uma enorme bobagem, eu vou dormir tranquila
comigo mesma por ter tentado fazer o meu pequeno milagre.Vou parar por aqui sem
a visita de meus amigos de blog, sem pensamento do dia, sem piada do dia, sem
imagens, sem mais nada, pois o que me resta, depois de esvaziar-me de indignação
é exatamente isso. Nada.

Repeti este post de 15 de Maio de 2006... Quase três anos se passaram e a minha indignação continua a mesma. A minha revolta ainda maior. Continuo sentada no mesmo lugar, com as mesmas idéias. Tenho medo. Medo de ver minha vida passar e nada mudar. Medo pelos filhos que não tive. Medo estranho. Uma vontade de chorar por mim, por todos nós. Uma dor no peito que não existe remédio para curar. Nada mais nos resta a não ser seguir em frente realizando o único pequeno milagre que ainda nos resta: sobreviver.

Enquanto isso... Na sala do Recanto II

Shaka ouvia calmamente o seu lado da história, saboreando seu chá. Sua história estava agora no mural do Recanto.

Milo: Shaka... eu não creio. Você quebrou seu templo todo?!?!?! *o olhar do Cavaleiro de Escorpião era de total assombro.*

Shaka: Existem muitas coisas em nossa vida que você não sabe, meu amigo.

Camus: E pelo visto, todas serão expostas nesses murais.

Shaka: Isso não me preocupa. É passado. Hoje sou feliz.

Camus: Todos somos...

Milo: Isso é verdade geladeira minha... estou com sono. Vamos descansar?

Camus: Se sua idéia é descansar, melhor que vá sozinho.

Milo: Eu tentei ser discreto! Camus, quarto, agora!!!

AA: Ei... está pensando que isso aqui é motel?!?!?!?!

Milo: Não. Estou apenas me sentindo em casa.

AA: *gota*

Frase do dia
"Sexo é o único esporte que não é
cancelado quando falta luz." ( Laurence J. Peter )

As Sete Cidades, o meu Amor!

Fic originalmente postada no ff.net em 14/10/2005. A versão original foi betada por Perséfone-San. A versão aqui postada não foi betada. Como Shaka mesmo falou, esta é a versão dele para os fatos de "Mil Perdões". A música incidental é "As Sete Cidades" do Legião Urbana.

As sete cidades, o meu amor


- Droga! - foi a primeira coisa que exclamei, o que se seguiu foi uma enxurrada de palavras de baixo calão e um riso amargo. Ao meu redor, tudo era caos. Eu já havia rasgado fotos, quebrado pratos, mas nada, absolutamente nada era capaz de arrancar aquela dor absurda de dentro de mim. Eu não conseguia entender o porquê. Ele tinha me traído. Tinha me abandonado.
Ri novamente, amargo, histérico.
Eu sempre tive controle cobre mim mesmo e também, ouso dizer, sobre os outros. Tudo sempre teve que funcionar como eu queria, na hora que eu queria. Meus desejos sempre foram soberanos. Sempre tive essa necessidade premente de controle. Método, disciplina, controle e distanciamento sempre foram as palavras que nortearam meu agir, meu viver, meu eu. Sim, esse era eu, até encontrá-lo e agora simplesmente isso; o fim. O nada. Eu deveria odiá-lo, estar ao menos com raiva, mas não, eu o amo cada vez mais, cada vez mais profundamente e sinto, bem no fundo de meu ser, em algum lugar dentro de mim que eu nem sonhava que existisse, um sentimento de culpa. Não consigo identificar onde errei, mas sei que errei. Sinto culpa e me odeio por isso.

Outra enxurrada de palavrões.

Onde eu aprendera esse palavreado chulo? Outro pedaço de mim desconhecido. O que mais eu iria descobrir nessa viagem insólita dentro de mim mesmo? Odeio essa sensação horrível de não conseguir controlar esse meu coração maluco. Odeio-me por não sentir o que deveria sentir e sim coisas que eu não fazia a menor idéia de onde estavam vindo. Eu só sei que elas estão aqui, dentro de mim mesmo.

Que tolo sentimental ridículo eu havia me tornado.

Comecei a organizar meus pensamentos, comecei a me acalmar e consequentemente a me sentir melhor. A dor aguda e forte foi se tornando paulatinamente tristeza melancólica. Patético. Eu estou patético, ou seria, eu sou patético?

Já me acostumei com a sua voz
Com teu rosto e teu olhar
Me partiram em dois
E procuro agora
O que é minha metade

Eu decididamente não saberei mais viver sem você. Lembrei desta canção e comecei a cantarolar sozinho em minha casa. Ainda bem que não tinha ninguém ouvindo, cantar decididamente não está entre as minhas proficiências.

Parecia uma canção boba, mais um enlatado para adolescentes em suas primeiras crises existenciais, mas por mais incrível que possa parecer eu me sentia assim. Não sou velho, longe disso, porém eu já morri, já renasci, já lutei, fui o primeiro a chegar ao oitavo sentido... Sou sábio, mas me peguei imaturo no que diz respeito a você, no que diz respeito a nós, no que diz respeito a sentir.

Quando não estás aqui
Sinto falta de mim mesmo
E sinto falta do meu corpo junto ao teu

Não sei quando, não sei como, nem sei o porquê. Só sei que a simbiose se deu de tal maneira que agora não sei mais quem sou. Não sei mais quem és. Agora, talvez, eu nunca mais consiga ser eu mesmo, ou juntar os meus cacos, porém, talvez este não seja o erro? Eu preciso conseguir me encontrar para te encontrar.

Meu coração é tão tosco e tão pobre
Não sabe ainda,os caminhos do mundo

Grande! Como um autor desconhecido pra mim, de um lugar tão distante, consegue ver tão bem dentro de mim? Eu realmente preciso descobrir os caminhos de minha vida para, quem sabe, tê-lo novamente. Como é possível que eu, o mais próximo de deus, precise de uma música boba para aceitar o óbvio?

Quando não estás aqui
Tenho medo de mim mesmo
E sinto falta do teu corpo junto ao meu

Olho ao meu redor. Minha casa tão metodicamente organizada está destruída. Está um caos. Reflete exatamente o que vai dentro de mim e tudo isso eu fiz sozinho. A ironia disso tudo é que agora o ambiente está a sua cara. Tudo a minha volta me lembra você. Queria me livrar de você e da sua presença mas, involuntariamente, acabei te trazendo cada vez mais para perto de mim.

Vem depressa pra mim
Que eu não sei esperar
Já fizemos promessas demais

Meu imediatismo, minha necessidade maior de tê-lo se manifestaram em forma de um grito mudo. Senti meu cosmo explodir com todos os sentimentos contraditórios que perpassavam por mim nestes momentos de dolorosa reflexão. Pela primeira vez em minha vida senti medo. O medo insano que uma criança sente do monstro invisível que se esconde no armário. Eu queria me levantar, me livrar da letargia que se instaurou em meu ser e ir até você, mas eu sabia que havia passado, e muito, dos limites do aceitável. Havia perdido a razão e você. Meu orgulho quebrantado era a única coisa que me restava, era o único pedaço de mim que eu ainda conseguia reconhecer. Não posso, não pude, não poderei ir até você. Desejo com todas as minhas forças que você seja menos tolo que eu (ou talvez mais, mas não tenho condições de fazer juízo de valores) e venha até mim.

Já me acostumei com a tua voz
Quando estou contigo estou em paz
Quando não estás aqui
Meu espírito se perde
Voa longe

Já estava quase chegando ao desespero novamente. Senti sua aproximação, senti sua presença. Um calor gostoso tomou conta de mim e circulei meus braços em volta de meu próprio corpo para tentar me proteger e me aquecer do frio que se seguiu, mas não consegui evitar o retorno da dor e do medo. Perguntei se veio escarnecer de mim, chutar cachorro morto.

Quanta tolice, quanta infantilidade. Eu devia te conhecer melhor. Você nunca faria isso. Mesquinhez não faz parte de você. Você é muito mais que isso. Mesmo assim, respondeu a minha pergunta idiota com um não seco e engasgado, estendeu sua mão e me entregou uma carta com lágrimas nos olhos. O que eu havia feito? O que nós havíamos feito? Você permaneceu em silêncio enquanto eu lia. Um silêncio pesado, que em muitos casos dizia mais que mil palavras. Senti as forças abandonarem minhas pernas e vou caindo, caindo... Até estar completamente sentado no chão de minha casa encostado em uma das muitas pilastras que a sustentam. Dissera tudo em sua carta. Preenchera as lacunas da minha dor. Respondera as minhas perguntas.

Então era verdade o que eu sentira. Meu amor me cegara a tal ponto que não pude ver o que estava fazendo. Nós dois somos um se nos completarmos, mas eu havia tentado nos tornarmos um o anulando e me anulando. Tentara torná-lo um eu que nem eu mesmo sabia existir. Quanta tolice! Mas eu tenho que aprender, e só você pode me ensinar e por uma última vez me humilhei. Eu que sou mestre, preciso, para ser feliz, me tornar novamente um aprendiz. E te pedi para ser o meu mestre. Por uma última vez, prometi a você e a mim, estaria a seus pés. Me estendeste sua mão e senti novamente seus lábios. Creio não existirem palavras capazes de descrever com exatidão tudo que senti naquele momento. Meu corpo apático se encheu de vigor, de vida. Foi um começo. O passado fora apagado. Ele simplesmente deixara de existir naquele momento.

Durante todo o dia que se seguiu, aprendemos juntos lições de vida e de convivência que nunca aprendemos durante os longos anos de nossos treinamentos e lutas. Ensinou-me como fazê-lo feliz e descobri, para meu próprio espanto, o quanto me doar e ceder pode me fazer feliz. Como as pequenas coisas da vida são grandes e como a felicidade é feita de momentos simples e singelos.

Meu corpo despertou. Senti desejo. Aquele desejo cru, libidinoso, mas não era a hora, não era o momento. Tínhamos coisas mais importantes para resolver e vi meu egoísmo nato ser suplantado pelo meu amor. Descobri a grandeza e a nobreza do sentimento que nutro por ti. Meu grande teste (de mim para mim mesmo, que fique claro!) foi ao anoitecer, perguntar-te se ias sair. Se me dissesse sim, tu irias sem pesar. Eu ficaria bem, feliz em esperar-te, mas me quiseste a teu lado. E eu fui. E me diverti como nunca em minha vida. Não há nada melhor que a liberdade. Não há nada melhor que a liberdade a teu lado. E como foi difícil compreender algo tão simples, tão óbvio, tão ululante.

Ao findar da noite, me perguntaste se eu confiava em ti. Mu, eu sempre confiei em você. Eu não confiava em mim. Agora confio em você, em mim, em nós. Fomos para sua casa em Jamiel e fizemos amor. Sim! Nós fizemos amor! E descansei em teu corpo, meus olhos fechados e minha respiração cadenciada fizeram com que pensaste que eu estava dormindo, mas não estava. Apenas saboreava os momentos de prazer que desfrutamos e pude, então, ouvir perfeitamente o que exclamara antes de adormecer:

"Shaka eu nos perdôo."
Frese do dia

"Há dois graus no orgulho: um, em que nos aprovamos a
nós próprios, o outro, em que não podemos aceitar-nos. Este provavelmente o mais requintado." ( Henri Frédéric Amiel )